A rede Oxxo abriu sua primeira loja no Brasil em dezembro de 2020, na cidade de Campinas (SP). Quatro anos depois, a rede celebra a marca de mais de 500 unidades em 26 cidades do estado de São Paulo, mas em meio a rumores de que em breve pode ser colocada à venda no país.
O dono da rede Oxxo é o Grupo Nós, uma joint venture formada por Raízen e Femsa (mexicana que representa a Coca-Cola) e avaliada em R$ 1,12 bilhão. Segundo uma reportagem da Bloomberg, a Raízen, também uma joint venture de capital aberto entre a Cosan e a Shell – estaria avaliando a venda de sua participação na rede. Procuradas pelo site IstoÉ Dinheiro, Oxxo, Raízen disseram que não vão comentar o assunto.
Em meio a esses rumores, o jornal Valor Econômico relata que a Raízen deve colocar à venda nos próximos meses um pacote de cerca de R$ 1 bilhão em usinas de geração distribuída. Segundo a apuração do jornal, a venda desses ativos – parte da divisão Raízen Power, não considerados estratégicos ao grupo – e daria fôlego à companhia para reduzir seu endividamento. A empresa não comentou o assunto ao Valor.
Levantamento do site InvestNews apontou que o Grupo Nós vem operando com margem negativa e prejuízo líquido. No exercício encerrado m março de 2023, a empresa registrou prejuízo de R$ 165,7 milhões, após ter apurado lucro líquido de R$ 69,9 milhões em 2019-20, mostrou o site. Para o período 2023-24, a companhia não divulgou os números. Vale dizer que o Grupo não tem capital aberto.
Primeira loja da Oxxo no Brasil, na cidade de Campinas (SP) (Crédito:Divulgação)
O consultor de varejo Alberto Serrentino, da Varese Retail, afirma que comenta especulações em relação à venda ou não do negócio entre Raízen e Femsa, mas observa que não há números recentes que possam atestar “como estão os resultados do negócio”.
“Não tem números se essas lojas estão maturando adequadamente, se as lojas têm um padrão de desempenho homogêneo, se elas já geram resultado operacional direto e caixa para poder depois remunerar a retaguarda, como está o modelo econômico e a perspectiva de retorno desse negócio, então não há números para poder falar sobre isso”.
Conveniência
A ideia da rede era ser uma loja de conveniência, como aquelas de postos de gasolina, mas espalhada pelas ruas, competindo com outros pontos de varejo de proximidade, como os próprios mercadinhos de bairro, a rede Dia, ou a versão menor das grandes redes varejistas, como Carrefour Express ou Pão de Açúcar Minuto. Além disso, sua chegada em meio à crise sanitária da pandemia de covid, era anunciada como geradora de empregos em meio a um cenário econômico cheio de incertezas.
Assim como outros mercados de proximidade ou conveniência, a proposta é estar em endereços em regiões populosas e de grande circulação, principalmente arredores de estações de metrô e terminais de ônibus, oferecendo itens de padaria, salgados (pizza, sanduíches, pão de queijo), refeições prontas congeladas, bomboniere, bebidas quentes e frias, mercearia, higiene, limpeza, um pouco de hortifrúti, carne e pet food.
“O modelo de loja de proximidade funciona bem em centros urbanas de alta densidade. E a rede consegue atender diversas jornadas, como padaria, mercearia, hortifruti. Aquela compra emergencial, compra rápida. Tem ainda a possibilidade do consumo em loja, de comida pronta. Ou seja, atende a diversas demandas”, aponta Serrentino.
Mas o consultor da Varese ressalta que, para se viabilizar economicamente, é preciso muita escala e densidade de loja, principalmente por conta da logística, que é diferente de um super mercado, pois as lojas precisam ser abastecidas diariamente, de forma fracionada e sem espaço de estoque.
“Isso dá muito trabalho na logística. Então tudo isso só se torna lucrativo em escala, e com densidade. E é o que eles estão fazendo. Eles estão abrindo muitas lojas, tendo São Paulo como principal foco de expansão, o que dá a retaguarda necessária para sustentar esse tipo de modelo de operação”, avalia.
Mais um Oxxo?
A rede chamou a atenção no começo da sua operação brasileiro pela quantidade de unidades. O que também gerou mais uma onda de memes nas redes sociais. Muitas vezes, há duas lojas na mesma quadra.
Ao anunciar a rede no Brasil, o presidente-executivo do Grupo Nós à época, Rodrigo Patuzzo, disse que o Brasil tinha “um mercado que tem potencial muito grande” para esse tipo de varejo, e o plano era alcançar 500 lojas em três anos, contudo, considerando também a bandeira Select, a rede de conveniência dos posts Shell.
A empresa inaugurou sua 500ª loja Oxxo em março deste ano.
A ideia também era abrir Oxxo em outros estados, sendo o primeiro deles o Paraná. O que ainda não foi feito.
Segundo a Reuters, além das unidades de rua, a estratégia do grupo contemplava colocar mercados Oxxo em shopping centers, hospitais, universidades e até condomínio. “Nós estamos fazendo parceria com fundos imobiliários para entrar na capital de São Paulo em alguns empreendimentos interessantes”, disse Patuzzo na ocasião.
O executivo não deu projeções de faturamento, mas afirmou que uma unidade exige aproximadamente R$ 750 mil em investimentos, incluindo o capital de giro.
Essa “proliferação” de Oxxo pelas ruas é uma estratégia de penetração de mercado vista como “normal” pelos especialistas, em linha com a proposta da rede. “Não se pode negar que a estratégia central da Oxxo é a capilaridade. Pode ser que ocorra uma sobreposição ou canibalização, mas isso é questão de adequar, ajustar. Mas a saturação é parte da estratégia”, diz Jean Rebetez, sócio-diretor da Gouvêa Consulting, especializada em varejo.
Atualmente, a Oxxo não abre quantas são exatamente as unidades. Divulga apenas “mais de 500”. Questionada sobre novas unidades previstas, disse apenas que “não divulga”, assim como não abre o faturamento. Portanto, não há como apontar se a rede segue no ritmo de expansão visto nos primeiros anos.
Hoje, as mais de 500 lojas Oxxo estão nas seguintes cidades do estado de São Paulo:
- Americana
- Campinas
- Diadema
- Guarujá
- Guarulhos
- Indaiatuba
- Jacareí
- Mogi das Cruzes
- Osasco
- Piracicaba
- Praia Grande
- Salto
- Santana de Parnaíba
- Santos
- São Bernardo do Campo
- São Caetano do Sul
- São José dos Campos
- São Paulo
- São Vicente
- Sorocaba
- Suzano
- Taboão da Serra
- Taubaté
- Valinhos
- Várzea Paulista
- Votorantim
Modelo mexicano
No México, a rede está presente há mais de 40 anos e já faz parte da rotina do país. O adensamento visto no Brasil ocorre também por lá. Com o adicional de que as unidades também oferecem ainda serviços financeiros.
“No México, uma parte importante da equação estava na correspondência bancária. O país não era muito bancarizado, um pouco o papel das lotéricas aqui no Brasil, como a presença em áreas de grande circulação, como na saída do metrô”, conta Eduardo Terra, da BTR-Varese.
Com isso, diz Terra, no México se conseguiu gerar fluxo e resultado. “Mas no Brasil isso [resultado] ainda não gerou. Não tem o bancário na equação, uma linha que no Brasil não existe e que no México é importante.”
Serrentino ressalta também como a rede “faz parte da paisagem” no México. “Eles são um modelo altamente dominante [no país]. Incorporaram serviços financeiros, estão em todo lugar”. Para o consultor, a visão da rede é de tentar, “de alguma forma”, replicar o modelo no Brasil. “Mas sabendo que o ambiente competitivo é diferente, a oferta instalada é diferente”. Por exemplo, na cidade de São Paulo, há outros formatos que competem e cumprem a função de proximidade e conveniência, como as padarias.
Para Rebetez, o mix visto no México, que diz ele inclui até mesmo eletrônicos, é um projeto de longo prazo para chegar por aqui.
Como que fala?
A Oxxo foi lançada pela Femsa no México em 1978 como uma loja de conveniência, ou mercado de proximidade. Ao longo desses 44 anos, se espalhou por outros países da América Latina, como Chile, Colômbia e Peru. Ao todo, são 21 unidades.
Ao chegar no Brasil, a rede se deparou com um desafio que não tinha nada a ver com estratégia de negócio: o nome. Para os brasileiros a marca era lida como “ôcho” ou “ócho”, ou seja, com o som de X. Mas, o nome original em espanhol se pronuncia “ó-quis-sô”. O tema, claro, virou meme por aqui.
A empresa insistiu para que os brasileiros adotassem a pronúncia original e fez até campanha para ensiná-la aos consumidores locais, incluindo a pronúncia “correta” na fachada de suas lojas e reforçando em suas redes sociais.
Hoje, uma parte dos consumidores até tenta usar a pronúncia original, mas a maioria segue falando “ôxo”.
24 horas
A rede precisou lidar com outro obstáculo no país. A proposta da rede é de que suas lojas fiquem abertas 24 horas. Mas, quando entraram em operação, descobriu-se que, na verdade, funcionavam 23 horas, já que durante a madrugada, precisavam fechar durante uma hora, correspondente ao intervalo do funcionário durante seu turno.
Além disso, justamente por ter um funcionário na madrugada, as lojas passaram a ser alvo de ladrões, com assaltos e saques em muitas unidades. O que levou a empresa a rever a proposta e alterar o horário de funcionamento de algumas unidades.
“Estão aprendendo com a nossa realidade”, diz Rebetez. “Seja pelo ajuste de demanda ou segurança, que se debateram com essa questão, principalmente essas 24 horas. Lembrando que são operações próprias, o que garante padrão e bastecimento, mas enquanto empresa, enfrenta os problemas sozinha, não tem franqueado que compartilha o investimento”.
A situação levou a uma rotatividade grande e negociação com o sindicato dos comerciários para melhoria das condições de trabalho.
“No México o modelo deu muito certo, mas aqui encontraram obstáculos não previstos, sendo a segurança pública um deles. Tiveram que mudar funcionamento, tiveram perdas com roubos que podem comprometer o resultado”, afirma Terra.
Parcerias e café
Recentemente a rede tem feito parcerias com marcas para lojas emblemáticas. Atualmente, em uma unidade na zona sul de São Paulo explora o tema do automobilismo com a Heineken. Com Rexona em Guarulhos, e com a Bauducco em Campinas.
“Essas alianças com grandes fábricas, marcas, fornecedores são muito estratégicas. E elas obviamente têm interesse em ter esse entendimento de consumo na ponta. A indústria está de olho nisso e o varejo pode se beneficiar desse aporte. Então é muito benéfico, tanto para a indústria quanto para o Oxxo. É muito interessante”, avalia Rebetez, da Gouvêa.
A rede também anunciou a chegada no Brasil de sua marca própria de café, a andatti, lançada no México em 2005. A rede também promoveu uma loja temática para a marca na região central de São Paulo.
*IstoÉ Dinheiro