Segundo decisão judicial obtida pelo Metrópoles, o BTG Pactual teria sido o primeiro banco a antecipar o pagamento de dívidas da Americanas
A Justiça deu a Americanas um dos ativos mais valiosos que ela poderia pleitear na situação atual: tempo. Em pedido para a 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, a varejista obteve o direito de congelar temporariamente o pagamento de suas dívidas e de reverter qualquer tentativa de execução de débitos pelos bancos.
A informação, divulgada inicialmente pelo colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, foi confirmada pelo Metrópoles.
Segundo o que alega a Americanas, o BTG Pactual foi o primeiro banco a tentar garantir o recebimento de dívidas. A instituição executou um débito de R$ 1,2 bilhão da varejista nesta sexta-feira (13/1). O bloqueio de recursos da Americanas pelo BTG foi uma das razões para o pedido da empresa ser atendido pela Justiça.
Uma das situações que permite aos bancos executar dívidas é o aumento do endividamento do pagador além dos limites estipulados.
“Noticia ainda a Requerente (a Americanas) que alguns credores já estão promovendo notificação da Companhia para declarar o vencimento antecipado das obrigações, com constrição de recursos da companhia em montante superior a R$ 1,2 bilhão de reais, promovida pelo Banco BTG Pactual”, diz o documento.
O juiz Paulo Assed, responsável pelo processo, concedeu 30 dias para que a Americanas decida se entrará em processo de recuperação judicial, etapa em que as empresas tentam renegociar seus débitos para evitar uma falência. Até lá, ela estará temporariamente protegida de “de qualquer arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição sobre os bens”, segundo a decisão de Assed.
Foi determinada, ainda, a reversão da tentativa de execução pelo BTG. A decisão da 4ª Vara servirá como ofício apresentado ao banco e a qualquer outro credor que tentar, por meios judiciais, antecipar dívidas da empresa.
A crise em que a Americanas está mergulhada foi disparada na noite de quarta-feira, quando um comunicado ao mercado anunciou, primeiro, que a varejista havia identificado “inconsistências contábeis” da ordem de R$ 20 bilhões em seu balanço financeiro e, segundo, que o presidente da companhia empossado dez dias antes, Sergio Rial, decidiu renunciar à luz dos fatos.
Veja a íntegra da decisão do juiz Paulo Assed:
BTG versus Americanas
A íntegra da tutela cautelar concedida Assed revela, ainda, que a Americanas admite ter uma dívida de R$ 40 bilhões. Até a última quarta-feira, o passivo oficialmente reconhecido da varejista era de pouco mais de R$ 20 bilhões. Ou seja: o endividamento seria o dobro do conhecido até então pelo mercado.
Se comprovado que o problema no balanço foi causado por pura manipulação contábil, esse terá sido o pior caso de fraude já registrado no mercado brasileiro.
O movimento do BTG para tentar garantir o recebimento de R$ 1,2 bilhão tem duas razões. A primeira é que o tamanho real do problema no balanço da Americanas não é conhecido. Em relatório divulgado a clientes na manhã desta sexta-feira (13/1), analistas do BTG dizem que as inconsistências contábeis podem ser maiores do que R$ 20 bilhões.
O banco acompanhou de perto o desenrolar da crise. Na manhã seguinte ao comunicado que expôs o rombo do balanço, o BTG organizou uma teleconferência para que Sergio Rial explicasse a alguns analistas de bancos e corretoras a situação da Americanas.
O fato de a teleconferência não ter sido comunicada ao mercado e nem aberta aos pequenos investidores desagradou a Comissão de Valores Mobiliários. No mesmo dia, a CVM oficiou a Americanas questionando por que o evento foi fechado e por que a íntegra da teleconferência só foi levada a público horas depois de ter ocorrido.
Na visão do “xerife” do mercado, o fato de Rial ter falado a um grupo seleto mercado financeiro teria permitido que os poucos participantes tivessem acesso a informações importantes que só seriam conhecidas pelo pequeno investidor quando as ações já derretiam mais de 70%.
A segunda razão para o BTG se antecipar foi a situação de caixa da Americanas. Com dívidas projetadas em R$ 40 bilhões (até agora), a empresa tem uma posição de caixa de pouco mais de R$ 8 bilhões. Não é, nem de longe, valor suficiente para pagar tudo que a Americanas deve. Nessa equação, o banco tentou garantir a sua fatia.
Fontes ouvidas do mercado financeiro pelo Metrópoles consideram que a dívida de R$ 40 bilhões empurrará a Americanas para uma recuperação judicial de qualquer maneira.
“Essa situação não é boa, claro, mas já era esperada, dado o tamanho da nova dívida. E os bancos sabem que se esticarem muito a corda não vão conseguir receber nada”, confidenciou um analista que está acompanhando a situação.
Ele diz que a recuperação judicial permitiria que a Americanas tenha mais tempo e condições mais favoráveis para organizar o balanço e pagar as dívidas. Até lá, é possível que os sócios majoritários tenham que colocar a mão no bolso para garantir que a empresa continue operando no curto prazo.
Os principais acionistas da varejista são Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles. O trio é dono da gestora 3G, que tem participação também em empresas como Ambev e Kraft Heinz.
*Metrópoles